sábado, 24 de maio de 2008

Uso de Animais na Ciência - 7


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O pesquisador, como homem de ciência, tem como objetivo maior a busca da verdade através dos fatos objetivos inerentes ao seu trabalho. A Ética é subjetiva e, entre seus preceitos, tenta estabelecer a relação entre o Bem e o Mal, portanto, ela jamais pode ser considerada científica. Aliás, a Ética é, em si, tão complexa, que é difícil enquadrá-la em qualquer dos ramos do saber, apesar de pertencer a toda atividade humana. Assim sendo, alcançar o equilíbrio entre a pesquisa científica e a Ética é muito difícil.

Não se contesta que preceitos éticos são complexos e relativos. Daí resultar difícil enquadrar a Ética como um ramo da ciência (um campo do conhecimento que busca a certeza). Ainda assim, o homem da ciência consegue discernir o fato da idéia, o subjetivo do objetivo, o preto do branco. Resulta simples para uma pessoa razoavelmente sensível, perceber que é interesse de todo ser vivo afastar-se de fatores lesivos ou desconfortáveis, e aproximar-se do maior ganho sensorial possível. Todo ser vivo busca o "prazer" e repudia a "dor". Essa é uma característica notoriamente observada no mundo vivo. Proporcionar o desconforto a terceiros é situação singular, normalmente apenas "justificada" mediante ameça a sobrevivência real e imediata. O uso de animais como objetos de manipulação e inferência científica a respeito da biologia humana mostra-se absurdamente ilógica, ultrajante e pouco eficaz. Por mais que a Ética seja um princípio relativo, não é possível ignorar o panorama atual vivido, resultado da exploração humana do reino não-humano. Há pouco tempo atrás negros, mulheres e judeus eram considerados entidades sub-humanas e portanto plenamente sujeitas a qualquer tipo de violência. Já não se defende isso. O homem constrange-se em rever semelhante comportamento ilógico.

Alcançar equilíbrio entre ciência e ética talvez seja uma realidade difícil, mas ainda assim resulta mais difícil aceitar a tremenda incoerência e paradoxo humano, que preocupa-se em defender uma postura ilógica e hipocritamente criticá-la ao mesmo tempo quando esta mostra-se de alguma forma inconveniente aos seus interesses. O capricho humano não justifica metade de seu modus operandi nem a realidade atual vivida. Mesmo assim, ele (o capricho humano) é defendido e cultivado a todo momento. Desde a infância...

A experimentação animal é um dos principais alicerces do progresso da Medicina. Sabe-se também que o progresso altera os códigos de ética e a sua interpretação, já que, por definição, as normas são subjetivas e arbitrárias. Diante desse fato, é preferível evitar-se qualquer extremismo, tanto por parte dos pesquisadores quanto daqueles que, por suas verdades transitórias, tentam alterar os caminhos do avanço científico.

Uma pequena revisão da História Humana mostra que os grandes saltos na Medicina foram aqueles que apoiaram-se na demonstração de fatos científicos experimentados no H.sapiens. Por mais que se usem modelos para inferir algo a respeito do homem, certezas serão apenas alcançadas quando o Homem for o objeto da experimentação. Em medicina e ciência trabalha-se com certezas, e não com suposições.

O progresso científico está longe de poder substituir os experimentos em animais por métodos alternativos. Por outro lado, não se devem ignorar os "direitos dos animais", que talvez não raciocinem e certamente não têm como se defender do homem, mas desejam viver sem sofrimento.

O homem subestima-se quando lhe convém. Não reluta em conquistar outros sistemas solares mas deprecia-se no momento de abdicar de uma prática que LHE é conveniente mas ultrajante a terceiros. O homem pode sim prescindir do uso de animais em laboratório. Basta entender e aceitar que animais de laboratório não correspondem a modelos precisos de sua biologia.

A utilização dos animais nas investigações científicas deve ser vista sob três aspectos: científico, ético e legal. Se o pesquisador mantiver a sua atividade equilibrada nesse tripé, terá maiores chances de progredir sem comprometer o seu trabalho e o seu nome.

Sob meu ponto de vista, o nome de alguém está já comprometido quando este reluta em evitar o sofrimento alheio. Sofrimento por sofrimento, então que esse sofrimento valha a pena no menor número de etapas possíveis. Se queremos entender a biologia humana e salvar vidas no menor espaço de tempo, experimentos em humanos satisfazem os preceitos acima. Experimentação animal é perda de tempo, dinheiro e muito mais vidas humanas Talvez a sociedade não aprove essa conduta por enxergar-se como potencial vítima da mesma estratégia. Mas então que ela não feche os olhos diante da mesma conduta e seus ultrajes quando a mesma for aplicada a outros que não eles mesmos, isto é, animais não-humanos. A hipocrisia não é uma qualidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. AUGUSTINUS, A. - As confissões. São Paulo, Edameris, 1964.
2. BACHELARD, G. - O novo espírito científico. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1968.
3. BALLS, M. - Replacement of animal procedures. Lab. Animals, 28: 193-211, 1994.
4. BELLENGER, C.R. - The ethics of using animals in biomedical research. Med. J. Aust., 158: 222-224, 1993.
5. BOWD, A.D. - Ethics and animal experimentation. Am. Psychol., 35: 224-225, 1980.
6. BRÉHIER, E. - Historia de la filosofía. Buenos Aires, Sudamericana, 1962.
7. BRENDA, J. - O pensamento vivo de Kant. São Paulo, Livraria Mateus Ed., 1962.
8. BRITT, D. Ethics, ethical committees and animal experimentation. Nature, 311: 503-506, 1984.
9. CHALLAYE, F. - Filosofia moral. Rio de Janeiro, Ed. Labor, 1966.
10. COHEN, C. - The case for the use of animals in biomedical research. New Eng. J. Med., 315: 865-870, 1986.
11. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA - Código de Ética Médica. 1988.
12. COOPER, A.J. & JOHNSON, C.D. - Animal experimentation. Br. J. Surg., 78: 1409-1411, 1991.
13. COOPER, J.E. - Ethics and laboratory animals. Vet. Rec., 116: 594-595, 1985.
14. COVINO, B.G.; DUBNER, R.; GYBELS, J.; KOSTERLITZ, H.W.; STERNBACH, R.A.; VYKLICKY, L.; YAMAMURA, H.; ZIMMERMANN, M. - Ethical standards for investigations of experimental pain in animals. Pain, 9: 141-143, 1980.
15. DIÁRIO OFICIAL - Secção I - 10713-20, 14 / 06 / 1988.
16. FLOWERS, F.H. - Research care in Canada. Ann. N.Y. Acad. Sci., 406: 144-149, 1983.
17. GOMES, O.M. - Cirurgia experimental. São Paulo, Sarvier, 1978.
18. GONÇALVES, E.L. - Pesquisa médica. Brasília, CNPq, 1983.
19. GRACEY, J.F. - Animal research. Br. J. Oral Maxillofacial Surg. 22: 349-351, 1984.
20. HELD, J.R. - Responsabilities of the investigation in the utilization of laboratory animals. Dev. Biol. Stand., 45: 213-219, 1980.
21 - HOFF, C. - Immoral and moral uses of animals. New Eng. J. Med., 302: 115-118, 1980.
22. HUCH, R. - Animal research in Japan. Lancet, 1: 156, 1980.
23. HUTCHINSON, D.R. & WINSLADE, J. - A practical guide to good clinical practice for investigators. Eur. J. Clin. Res., 1: 71-82, 1991.
24. LACHMANN, P. The use of animals in research. Br. Med. J., 305: 1, 1992.
25. LÁZARO DA SILVA, A. - Ética médica. Belo Horizonte, Cooperativa Editora e Cultura Médica, 1982.
26. MARITAIN, J. - A filosofia moral. Rio de Janeiro, Agir, 1964.
27. NIETZCHE, F.W. - A gaia ciência. Rio de Janeiro, Hemus, 1976.
28. NOWELL-SMITH, P.H. - Ética. São Paulo, Bestseller, 1966.
29. ORLANS, F.B. - Regulation of animal experimentation. Acta Physiol. Scand. suppl. 554: 138-152, 1986.
30. OSSWALD, W. - Ética na pesquisa com animais e aplicação em humanos. Acta Med. Port., 5: 222-225, 1992.
31. PASCAL, B. - Pensamentos. Porto Alegre, Globo, 1973.
32. - PATON, W.D.M. - Animal experiment. Ann. N. Y. Acad. Sci., 406: 201-214, 1983.
33. PETROIANU, A. - Elaboração do trabalho científico. Médico Moderno, 4: 63-72, 1985.
34. PETROIANU, A. - Publicação do trabalho científico. Ciência e Cultura, 37: 410-413, 1985.
35. PETROIANU, A. - Autoria de um trabalho científico. Arquivo Médico, 11: 83-88, 1991.
36. PETROIANU, A. - A pesquisa em Medicina. Medicina, 25: 327-329, 1992.
37. PETROIANU, A. Considerações sobre a pós-graduação stricto sensu em Medicina. Rev. Ass. Méd. Brasil., 41: , 1995.
38. PRENTICE, E.; JAMETON, A.; ANTONSON, D.; ZUCKER, I. - Prior ethical review of animal versus human subjects research. Invest. Radiol., 23: 695-697, 1988.
39. REGAN, T. - The rights of human and other animals. Acta Physiol. Scand., 128 suppl. 554: 33-40, 1986.
40. ROSNER, F. - Animal experimentation. Arch. Int. Med., 144: 927-928, 1984.
41. ROWAN, A.N. - Formulation of ethical standards for use of animals in medical research. Toxicol. Lett., 68: 63-71, 1993.
42. SCHOSSLER, J.E. - A escolha, contenção e manuseio de animais de experimentação. Acta Cir. Bras., 8: 166-168, 1993.
43. SCHULTZE-PETZOLD, H. - Problems associated with the prevention of cruelty to animals in modern livestock breeding. Zentralbl. Bakteriol. Orig. - B, 163: 203-210, 1976.
44. SCHWEITZER, A. Cultura e ética. São Paulo, Melhoramentos, 1953.
45. SENECA, L.A. - Tratados filosóficos. Buenos Aires, Ateneo, 1952.
46. SPINOZA, B. - Éthique. Tomo 1. Paris, Graniere Frères, 1956.
47. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. III Simpósio Nacional de Pós-Graduação nas Áreas Biomédicas. Ribeirão Preto, USP, 1975.
48. VIANA, M.G.V. - Ética geral e profissional. Porto, Livraria Figueirinha, 1968.
49. VIEIRA, S. & HOSSNE, W.S. Experimentação com seres humanos. São Paulo, Editora Moderna, 1987.
50. WIEBERS, D.O.; BARRONS, R.A.; LEANING, J.; ASCIONE, F.R. - Ethics and animal issue in U.S. medical education. Med. Educ., 28: 517-523, 1994.

Nenhum comentário: