Ao longo da história temos tratado animais como meros objetos desprovidos de desejos, sensações e consciência.
Os submetemos (sem exceção de espécie, gênero ou qualquer outra característica biológica) a um estilo de vida escravagista, ditatorial e cruel.
É improvável que tivessemos consentimento por parte deles quanto ao modo como os utilizamos em função de nossas necessidades (por sinal, muitas delas desnecessárias).
De fato, consentimento é um aspecto problemático a ser adquirido no caso de criaturas geralmente incapazes de travar comunicação com humanos segundo os moldes ao qual estamos acostumados (fala, escrita, mímica). Os limites do conhecimento humano nos mantém muito distantes de compreender como animais podem pensar a respeito do modo como nós os tratamos. No entanto, temos acesso a uma grande gama de indícios sobre isso.
Um exemplo típico e vulgar é aquele em que reconhecemos o desconforto de um animal perante eventos onde são constatadas alterações de ordem fisiológica : pupilas dilatadas, aumento do batimento cardíaco, liberação hormonal intensa, etc.
Reconhemos os mesmos indícios em humanos.
Quando ? Quando estes vivenciam pânico, dor e medo.
Em suma : quando sofrem (ressalva ao fato de que sofrimento nem sempre está associado a essas manifestações orgânicas - mais um motivo para um maior cuidado e atenção para com os animais).
Podemos sujeitar animais a um grande número de exames, estudando e observando suas preferências, motivações e estados emocionais, mas essencialmente não podemos pensar como eles. Assim, não podemos extrapolar que eles ignorem ou consintam com os excessos que cometemos com eles, sendo dentre muitos, criação industrial em larga escala, experimentação científica, trabalho forçado, abate programado, confinamento ou desapropriação.
Se usamos a filosofia de extrapolar/derivar conclusões em função de similaridades previamente conhecidas (também conhecido por Método Científico), temos muito mais motivos para acreditar que animais sintam os mesmos desconfortos que nós ao invés de pensar que eles são desprovidos de desejos e sensações.
O ponto essencial é que humanos são também animais. Do ponto de vista evolutivo.
Humanos recém-nascidos são desprovidos das complexas habilidades comunicativas encontradas em um ser adulto. Nem por isso os submetemos ao 1/5 do que fazemos com animais.
Da mesma forma, pessoas que nascem surdas e mudas são automaticamente dotadas de direitos básicos mesmo em função de seu silêncio e debilidade funcional/comunicativa. A lógica se mantém.
Se consideramos recém-nascidos, deficientes físicos/mentais e idosos como criaturas carentes de uma imensa gama de capacidades deliberativas (e portanto os consideramos como dependentes legais de terceiros), deveríamos aplicar o mesmo princípio aos animais, indifrente da espécie a que pertençam.
Em suma : se garantimos aos humanos uma pletora de acessos e liberdades, devemos garantir aos animais um mínimo muito maior do que supostamente lhes permitimos hoje em dia. Muito maior mesmo.
Temos por hábito tratar cada humano como um indivíduo de valor ao considerar suas reivindicações morais e sensoriais. Assumimos que direitos e interesses residem no indivíduo, portanto.
Assim, não tomamos por criminosos todos os indivíduos de um grupo pelo fato de apenas um deles ter cometido um delito. Não é porque um negro mata alguém que todos os negros do planeta sejam assassinos. Segundo a mesma lógica (em um exemplo contrário) posso citar que o governo Alemão proporcionou compensações as vítimas do Holocausto mas não a todos os judeus.
Notoriamente, vemos aqui a distinção entre o indivíduo e o grupo ao qual ele pertence.
Curiosamente, assumimos que animais pertencem a uma categoria totalmente distinta da categoria humana.
Estes últimos podem usufruir indistintamente de um conjunto básico de direitos a partir de seu nascimento (http://www.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm) enquanto animais, não.
Para com animais não há direitos; não há distinções.
Animais existem para serem predados, consumidos, subjugados, utilizados como ferramentas. Todos eles.
Aos animais, lhes negamos qualquer direito ético à dignidade e conforto.
É um patético paradoxo humano.
Aliás, o homem é um absurdo ético.